Religião se aprende com a prática dos pais
Por Içami Tiba
O ser humano não nasce com religião, mas sim com o que eu chamo de religiosidade. É gente gostar de gente, unindo as pessoas, formando sociedades e civilização.
A religiosidade estabelece dentro da mente de um bebê uma hierarquia sensoperceptiva relacional. O bebê sente que algumas pessoas o acolhem melhor que outras e relaxa e se aquieta numa entrega total. Assim, ele demonstra que estabelece um primeiro critério puramente sensitivo: agradável/desagradável. Quando o bebê consegue, já estica os bracinhos em direção à pessoa que ele prefere. Ele não avalia o caráter, a intenção, a história da pessoa. Ele simplesmente prefere e pronto, sem se incomodar em ferir a sensibilidade de qualquer pessoa. Vive a sua paz.
Assim também surge outra hierarquia que é entre as pessoas conhecidas (que ele tem em sua memória também em formação) e desconhecidas. O bebê estica os seus bracinhos também para as pessoas mais conhecidas e chora quando estranhos se aproximam dele, mesmo que sejam parentes.
Guardar na memória as pessoas "agradáveis" e os conhecidos dá ao bebê as primeiras noções sobre relacionamentos humanos. Crianças acreditam no que os adultos lhes fazem e falam. Uma criança fica com sua auto-estima abalada se um adulto conhecido e agradável lhe ofende, mas também um agrado promove o contrário. A auto-imagem de uma criança é muito baseada na maneira como ela é tratada pelos adultos, pois ela confia plenamente neles.
Quando os pais são praticantes de uma religião, levam seus filhos pequenos juntos às práticas. É natural que os filhos perguntem aos pais sobre as práticas religiosas, como perguntam sobre tudo o que não sabem. Assim, eles acreditam em fadas, príncipes, Papai Noel e em Deus. Para o pensamento concreto das crianças tudo tem que ser forma e comportamento humano que é o que elas conhecem. Estes filhos absorvem o que os pais fazem, inclusive as suas práticas. Eles terão confiança e temores que os pais têm e nisto inclui-se a religião. Assim como os filhos obedecem aos seus pais, pela religião eles aprendem a obedecer ao seu Deus. Criança vê, criança faz.
Assim, os pais praticantes têm uma hierarquia de valores que passam naturalmente aos seus filhos, que passam também a praticá-la. Os praticantes de religião incorporam uma hierarquia de valores de respeito às autoridades religiosas e acima de todos está Deus, a entidade maior, mais poderosa, mais presente e mais sábia que todos e tudo no mundo, para a maioria das religiões.
A prática tem mostrado o quanto mais que outras uma criança que respeita seus pais tem mais facilidade de respeitar outras autoridades e pessoas, não se deixando levar pelos destemperos emocionais e tiranias tão presentes nos dias de hoje. Se os pais cumprem os mandamentos religiosos, os filhos também tendem a cumpri-los e assim a família e a escola religiosas passam a ter uma força e energia acima das próprias a torná-las mais unidas e encontradas.
A religião foi provavelmente elaborada por iluminadas lideranças humanas em tempos de grande sofrimento popular. O povo precisava acreditar em algo maior e melhor do que estavam vivendo. Com esta crença, os sofrimentos eram mais tolerados, pois havia algo superior a quem estavam atendendo. A sensação de estar a serviço de algo superior alivia o sofrimento e enobrece o sacrifício.
Na adolescência, o ser humano questiona e rejeita o que não aprova. Da religião, o onipotente juvenil questiona os dogmas, as verdades absolutas e imutáveis, de, para ele, "outros deuses". A religião perdeu muitos praticantes no mundo na proporção do exagero da sua distância ao natural saudável do ser humano, e da atualidade.
A maior força da religiosidade se manifesta exatamente na adolescência, quando ele acredita mais na sua paixão do que em qualquer religião ou força familiar impositiva. O espírito Romeu e Julieta existe hoje em qualquer canto do mundo, pois religiosidade é gente gostar de gente.
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